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O Leitor – **** de *****

fevereiro 10, 2009 Deixe um comentário
É, no mínimo, curioso o caso deste “O Leitor”. Em um ano bizarro onde o melhor filme acabou sendo, curiosamente, o filme de maior bilheteria (refiro-me a “Batman – O Cavaleiro das Trevas”), a obra de Nolan fora esnobada pela Academia por mero preconceito. No lugar, vários filmes superestimados acabaram sendo selecionados para a disputa do prêmio principal do Cinema, incluindo “O Curioso Caso de Benjamin Button” e “Quem Quer Ser um Milionário?”, que detém total favoritismo na conquista do prêmio que será atribuído no dia 22 de fevereiro deste ano de 2009. No entanto, uma grande surpresa surgiu dentre os principais candidatos. Refiro-me a este “O Leitor” que, até então, apareceu como a grande zebra do Oscar. Um filme em que ninguém apostava uma única ficha surge, inexplicavelmente, entre os principais indicados e, pasmem, dentre os quais eu já assisti, a obra dirigida por Stephen Daldry revelou-se a melhor de todas.

Ficha Técnica:
Título Original: The Reader.
Gênero: Drama.
Ano de Lançamento: 2008.
Site Oficial: http://www.thereader-movie.com/
Nacionalidade: Estados Unidos da América / Alemanha.
Tempo de Duração: 124 minutos.
Diretor: Stephen Daldry.
Roteirista: David Hare, baseado em livro de Bernhard Schlink.
Elenco: David Kross (Michael Berg – jovem), Kate Winslet (Hanna Schmitz), Ralph Fiennes (Michael Berg – adulto), Jeanette Hain (Brigitte), Susanne Lothar (Carla Berg), Alissa Wilms (Emily Berg), Florian Bartholomäi (Thomas Berg), Friederike Becht (Angela Berg), Matthias Habich (Peter Berg), Bruno Ganz (Prof. Rohl), Max Mauff (Rudolf), Karoline Herfurth (Marthe), Lena Olin (Rose Mather / Ilana Mather), Alexandra Maria Lara (Ilana Mather – jovem) e Frieder Venus (Médico).

Sinopse: Michael Berg (David Kross) é um jovem que perambulava pelas ruas de Berlin sem imaginar que era portador de uma doença contagiosa. Quando o mesmo começa a passar mal nas ruas, recebe a ajuda de Hanna Schmitz (Kate Winslet), uma mulher rude e bem mais velha que ele. Com o passar do tempo, o jovem vai se interessando pela moça e ela por ele, até viverem um caso amoroso que irá mudar as suas vidas para sempre.

The Reader – Trailer:

Crítica:

Hollywood parece ter caído em uma moda que confesso não ser lá muito fã: a inclusão de mais de um filme em uma única fita. Quê?! Pergunta o leitor assustado. Sim, eu sei que parece confuso, mas no fim das contas não é. Citarei alguns exemplos. Em “Batman – O Cavaleiro das Trevas” temos, a princípio, um drama policial à lá “Fogo Contra Fogo” que, ao chegar em sua segunda metade, se converte em um drama existencial onde o protagonista começa a questionar se a sua presença contribui ou atrapalha no combate ao crime organizado de Gotham City. Em “Quem Quer Ser um Milionário?” (depois do Bafta será que alguém ainda duvida que ele “leva” o Oscar de Melhor Filme esse ano?), a metade inicial que abordava a sofrida infância do protagonista teve o seu brilho ofuscado por uma estória de amor típica de um ‘filmeco’ de “Sessão da Tarde” que foge completamente do que o roteiro aparentava querer retratar em seu início. Em “Austrália” então nem se comente a fragilidade e a artificialidade com que tal recurso é empregado. O início do longa, que descaradamente pajeia clássicos como “…E o Vento Levou”, “O Mágico de Oz” e, principalmente, “Lawrence da Arábia”, se revela divertidinho, mas descamba para o piegas e o excessivamente melodramático em sua metade final, quando sentimos que a sinopse inicial do filme é abandonada sem quaisquer resquícios de sutileza e o roteiro parte para algo completamente diferente do que havíamos visto até então.

Entretanto, não é porque um filme adota este recurso “dois em um” que ele pode ser automaticamente tachado de ruim, artificial, ou seja lá o que for. Em “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, por exemplo, o roteiro e a edição do filme se revelam sagazes o bastante para encerrar uma estória e dar início a outra de um modo que nos cative cada vez mais com a obra. A mesma coisa não ocorre com “Quem Quer Ser um Milionário?”, uma vez que a previsibilidade de sua segunda estória anula muitas expectativas que havíamos criado em cima da primeira metade do filme. Em “Austrália” o emprego de tal recurso revela-se sofrível, algo que faz com que o filme se torne inteiramente ruim. Mas e em “O Leitor”? No filme dirigido por Stephen Daldry o uso deste recurso (se é que pode ser alcunhado desta forma) é adotado a fim de mesclar três filmes em um só, fazendo com que, ao mesmo tempo em que este soe um tanto o quanto desconexo em alguns de seus momentos, revele-se intrigante durante a maior parte de sua projeção.

A princípio, o longa lembra um pouco “Um Tango em Paris”. Michael é um garoto de apenas 15 anos que vive na Berlin pós-guerra, quando o povo alemão estava com a moral baixa pela derrota sofrida durante a Segunda Guerra Mundial e pela vergonha do holocausto. Naquela época, a taciturnidade imperava entre os alemães e, seguindo o exemplo destes, o adolescente era demasiadamente calado, não possuía amigos e a sua existência resumia-se a nada. Em um dia gélido e chuvoso o jovem começa a passar mal e a vomitar pelas ruas. É aí que ele conhece Hanna, uma mulher carrancuda, mal-humorada, rude e que aparenta desconhecer todas as regras básicas de etiqueta (só para se ter uma idéia, ela testa a temperatura do ferro de passar cuspindo na superfície deste), mas que mostra o mínimo de atenção para com o jovem e leva-o até a sua casa. Michael começa a nutrir um forte e estranho interesse pela moça, passando a visitá-la com freqüência e envolvendo-se em um bizarro relacionamento onde ambos passam a fazer sexo sem nem ao menos saberem os nomes um do outro.

Durante esta parte podemos notar que o filme utiliza o caso amoroso dos dois como uma forma de retratar a estranha situação em que a Alemanha encontrava-se naquele período. Conforme já fora dito, o país encontrava-se inerte em uma profunda vergonha graças ao holocausto. As pessoas aparentavam ser frias e rudes devido aos seus comportamentos, mas na verdade eram carentes e necessitavam de ajuda. Logo, o relacionamento entre Michael e Hanna funcionava como uma forma de ambos exprimirem os seus sentimentos, em uma nação onde isso era praticamente impossível. O romance entre eles não é belo, mas sim triste, na medida em que os mantém sob uma farsa. Eles mal se conhecem, como podem se amar? E nisso, o filme peca terrivelmente ao tentar ‘glamourizar’ além da conta as seqüências envolvendo cópula carnal, uma vez que as mesmas não visam transmitir alegria, mas sim o sofrimento individual de ambos, que torna-se mútuo quando eles estão juntos.

Entretanto, o romance entre Michael e Hanna vai sendo desenvolvido de modo cada vez mais magistral pelo roteiro. Para que o garoto obtenha o direito de fazer sexo com ela, a moça passa a exigir que este a leia um livro diariamente. Logo, percebemos que um supre as necessidades de outro. Hanna é analfabeta, como conseqüência disso precisa que alguém leia uma ficção para ela, não apenas para que possa se distrair com uma estória qualquer, mas também para poder preencher as lacunas vazias de sua vida. Michael é um garoto muito solitário, a família não lhe confere atenção. Ele busca em Hanna algo muito além de experiência sexual. É nela que ele se reconforta. É nela que ele encontra um propósito para a sua vida. O casal se completa, pois um se apóia no outro e ambos ganham muito mais energia quando estão juntos. Energia o bastante para encararem a vida de frente.

Até este momento pensamos que o filme irá tratar somente do romance entre ambos e que iremos testemunhar o apogeu e/ou a queda de tal relacionamento. Ledo engano. O filme de romance encerra-se repentinamente e Hanna sai de cena sem mais nem menos. Oito anos mais tarde, porém, Michael torna-se acadêmico de Direito e, coincidentemente, participa de um júri onde vê a sua ex-amante (é com hífen ou não?) sendo acusada de exterminar um grande grupo de judeus em um campo de concentração (repare que “O Leitor”, a partir deste momento, assume uma postura parecida com a do excelente “O Julgamento de Nuremberg”). Hanna, de fato, tem a sua parcela de culpa, mas acaba sendo punida de um modo muito mais rígido do que realmente merecia pelo simples fato de ocultar o seu analfabetismo. Bastava dizer que não sabia escrever e pronto, sua pena cairia de um modo extremamente considerável. Mas por que Hanna não assumiu a verdade? Por vergonha. Vergonha de si mesmo, este era o sentimento pelo qual o povo alemão passava naquela época, desde o término da guerra.

O que nós, espectadores, passamos a sentir a partir de então é confusão. O filme se mostra ligeiramente desconexo entre uma estória e outra, apesar de ser bem surpreendente (quem iria esperar que uma estória de amor fosse tomar tais proporções?). Durante uma parte considerável entre o primeira e o segunda ato de “O Leitor”, sentimos que um é extremamente independente do outro e, assim, funcionariam melhor separadamente. O terceiro ato do filme, no entanto, vem para eliminar esta desconfortável sensação parcialmente (e eu disse apenas parcialmente). Passamos a ver mais relação entre o primeiro e o segundo ato, embora os dois, mesmo com o término do filme, continuem não possuindo um elo verdadeiramente completo.

Outra falha de “O Leitor” consiste em sua estrutura não-linear (hífen?). Se tal recurso funcionava magistralmente bem em filmes como “Pulp Fiction – Tempo de Violência”, “Cidadão Kane”, “Rashomon” e até mesmo no recente “Missão Impossível 3”, no longa dirigido por Stephen Daldry o mesmo estraga a surpreendente reviravolta incluída em seu roteiro. Sim, pois quando percebemos que o Michael adulto, muito bem interpretado por Ralph Fiennes, irá narrar um antigo caso de amor, logo concluímos que este não fora bem sucedido por algum motivo, e quando o rapaz passa a se relacionar com Hanna, não nos cativamos tanto o quanto deveríamos nos cativar com o relacionamento de ambos, pois sabemos de antemão que os dois irão romper mais cedo ou mais tarde.

Mas no final das contas o saldo de “O Leitor” é extremamente positivo. Se o roteiro se revela desconexo em algumas partes e a narrativa não-linear estraga uma interessante surpresa que teríamos na metade do filme, a obra ao menos realiza um amplo estudo sobre a vergonha e a frieza em que a Alemanha pós-guerra encontrava-se inerte na época retratada tomando como pano de fundo o bizarro romance entre duas pessoas completamente frígidas. E por mais que o relacionamento entre ambos seja previsível, graças a estrutura não-linear empregada pelo filme, é praticamente impossível não se cativar, de uma forma ou de outra, com o mesmo. Os responsáveis por isso, além do roteiro que os explora muito bem, são os atores que rendem atuações fantásticas, sobretudo Kate Winslet que encarna Hanna perfeitamente bem (e por mais que a atuação de Meryl Streep como a Irmã Aloysius Beauvier em “Dúvida” seja superior a de Winslet, creio que o Oscar de Melhor Atriz deverá ficar com o par de Leonardo DiCaprio em “Foi Apenas um Sonho”, como uma forma de compensá-la pelos seus trabalhos em outros filmes menos recentes) e os demais aspectos técnicos e artísticos que compõem o longa.

Obs.: Queria ter feito este comentário ao longo da crítica, mas achei que tiraria um pouco o foco da mesma, uma vez que centrei-me em seus personagens e não nos aspectos técnicos da produção. A mixagem de som de “O Leitor” conseguiu conquistar-me de modo fascinante. É incrível notarmos o profissionalismo com que os microfones foram instalados no cenário, sendo que, principalmente durante a seqüência inicial do filme, podemos ouvir com perfeição certos ruídos que só têm a acrescentar à trama, tais como: talheres tinindo, o café sendo depositado em uma xícara, uma colher se chocando contra um ovo com a intenção de quebra-lo, dentre muitas outras coisas. É uma lástima, aliás, que a Academia não tenha indicado o filme neste categoria. Vergonhoso também é não indicá-lo a Melhor Maquiagem, uma vez que o trabalho que “envelhece” Kate Winslet é praticamente perfeito.

Obs. 2: Um grande amigo meu atentou-me para um detalhe com relação a este texto. Trata-se de um erro crasso de minha parte durante a seguinte frase: “Hanna, de fato, tem a sua parcela de culpa, mas acaba sendo punida de um modo muito mais brando do que realmente merecia pelo simples fato de ocultar o seu analfabetismo.“. Ok, na verdade, eu iria colocar rígido, mas sabe-se lá o porquê escolhi brando no lugar. Enfim, um erro imbecil de minha parte, mas que já fora corrigido. Agradeço ao meu amigo Thiago Rozante.

Avaliação Final: 8,2 na escala de 10,0.

Foi Apenas um Sonho – ** de *****

fevereiro 6, 2009 Deixe um comentário
Sempre digo que raramente guardo expectativas positivas ou negativas acerca de um filme antes de assisti-lo, logo, fui ao Cinema de Campinas (passei três dias hospedado nesta cidade a serviço da Prefeitura Municipal de minha cidade e aproveitei uma hora de folga para ir ao cinema conferir o novo filme de Sam Mendes) assistir a este “Foi Apenas um Sonho” sem esperar muita coisa do mesmo. A princípio, o casal DiCaprio e Winslet não me atrai nem um pouco, pois encontro-me anosluz (é sem hífen?) de estar entre os fãs de “Titanic”, um dos filmes mais superestimados de todos os tempos. Sendo assim, os únicos fatores que poderiam vir a contribuir (mas não contribuíram) para o aumento de minha expectativa seriam: 1º) o longa ter sido dirigido por Sam Mendes, que assinou “Beleza Americana”, um de meus cem filmes prediletos; 2º) o roteiro ter sido inspirado no ótimo livro de Richard Yates e 3º) a curiosa e inesperada esnobação da Academia perante o mesmo, uma vez que a obra em questão recebeu muitas indicações em outras premiações, dentre as quais o aclamado Globo de Ouro. E falando na esnobada que a Academia deu em “Foi Apenas um Sonho”, acredito que tenha a resposta para tal, conforme o leitor poderá encontrar na crítica infra exibida.

Ficha Técnica:
Título Original: Revolutionary Road.
Gênero: Drama.
Ano de Lançamento: 2008.
Site Oficial: http://www.revolutionaryroadmovie.com/
Nacionalidade: Estados Unidos da América / Reino Unido.
Tempo de Duração: 119 minutos.
Diretor: Sam Mendes.
Roteirista: Justin Haythe, baseado em livro de Richard Yates.
Elenco: Leonardo DiCaprio (Frank Wheeler), Kate Winslet (April Wheeler), Michael Shannon (John Givings), Ryan Simpkins (Jennifer Wheeler), Ty Simpkins (Michael Wheeler), Kathy Bates (Helen Givings), Richard Easton (Howard Givings), Kathryn Hahn (Milly Campbell), Zoe Kazan (Maureen Grube), Dylan Baker (Jack Ordway), Keith Reddin (Ted Bandy), Max Casella (Ed Small), Max Baker (Vince Lathrop), Jay O. Sanders (Bart Pollack), Duffy Jackson (Steve Kovac), John Behlmann (Sr. Brace) e Kristen Connolly (Sra. Brace).

Sinopse: Frank (Leonardo DiCaprio) e April (Kate Winslet) formam um casal aparentemente feliz, mas que na realidade está insatisfeito com o vazio existencial que tanto atormenta os seus cotidianos. Frank é funcionário de uma empresa na qual o seu pai trabalhou durante vinte longos anos e nunca fora reconhecido. Perturbado pelo medo de tornar-se a imagem de seu progenitor, o rapaz vive em constantes crises com a sua esposa April. Esta, por sua vez, também encontra-se insatisfeita com o seu “status quo” e propõe ao marido uma solução extremamente radical: abdicarem da vida confortável que possuem em sua casa, alcunhada de Revolutionary Road, e mudaram-se a Paris.

Revolutionary Road – Trailer:

Crítica:

Por que será que todo filme protagonizado pelo casal Leonardo DiCaprio e Kate Winslet tem que ser apenas morno e nada mais? Quando ambos assumem individualmente o papel principal de um determinado filme, o mesmo se revela bem acima da média (como foi o caso de “Os Infiltrados”, por parte de DiCaprio, e “Pecados Íntimos”, por parte de Winslet), mas quando ambos atuam juntos surgem “negócios” superestimados do naipe de “Titanic”. A mesmíssima coisa ocorreu com este “Foi Apenas um Sonho”, mas com uma diferença: ambos os atores estão bem mais amadurecidos agora e se vem (o circunflexo caiu neste caso, não caiu?) capazes de apresentar atuações bem mais convincentes que o casal clichê Jack/Rose.

E são justamente as atuações de DiCaprio e Winslet, somadas à química exalada pelas mesmas, que constituem uma das maiores qualidades desta produção roteirizada por Justin Haythe. Ambos os atores contam com papéis difíceis de serem interpretados e, ainda assim, o fazem com maestria. E se o desenvolvimento dos protagonistas deste longa se revela falho, isso não se deve ao trabalho dos mesmos, mas sim à falta de capacidade do roteiro em criar situações que nos faça sentir na pele o real drama de seus protagonistas.

Pode-se dizer a mesma coisa do personagem John Givings, muito bem encarnado por Michael Shannon. É de Givings que provém os diálogos que definem perfeitamente bem a fragilidade do casal moldado nos dogmas do american way of life, entretanto, o mesmo sofre por ser muito mal explorado pelo roteiro. Além de aparecer muito pouco em cena, o personagem de Shannon é bastante prejudicado pelo modo maniqueísta como o roteiro o introduz na trama. Francamente, é coincidência demais o fato de uma amiga de um casal de jovens com constantes crises existenciais pedir para que os mesmos interajam com o seu filho que, em uma ironia do destino, se revela uma pessoa louca e que critica todos os ditames de relacionamentos amorosos do tipo os de Frank (DiCaprio) e April (Winslet).

Mas voltando às qualidades do longa, digo que estas não se resumem apenas às atuações por parte de todo o seu elenco. Não, vão muito além disso. A recriação dos anos 50, por exemplo, é simplesmente fantástica, a começar pela ótima trilha-sonora, que nos remete diretamente à época, passando pela fantástica seleção dos figurinos. A direção de arte também contribui muito para o resultado final da película, pois se responsabiliza pela criação de ambientes bem interessantes, como é o caso do clube onde Frank e April se conhecem logo no início da película. A fotografia? Sim, é ótima e confere a ênfase necessária para retratar o sentimento de tristeza em que vive o casal, alternando entre tons alegres durante os bons momentos do casamento entre ambos e tons lúgubres durante os vários períodos soturnos de tal matrimônio.

E se a fotografia da obra colabora, e muito, para a sensibilidade desta, a direção de Mendes, por mais incrível que possa parecer, atrapalha. Ao contrário do que havia feito em “Beleza Americana”, o marido (na vida real) de Kate Winslet realiza aqui uma direção fraca e pouco criativa, onde a criação de planos e ângulos se mostra quase nula. A competência que Mendes tem ao conduzir o seu brilhante elenco não tem nos demais aspectos referentes à direção do filme, sobretudo no que diz respeito à proporção de uma sensibilidade que venha a ligar o espectador à trama de um modo mais consistente, sejam pelas críticas sociais tecidas pela mesma, sejam pelos problemas pelos quais passa o casal.

A verdade, no entanto, é que a falta de sensibilidade contida na obra não é culpa exclusiva da direção desta. Nesse quesito, o roteiro é o maior vilão. Utilizando o enfadonho e, ao mesmo tempo, conturbado casamento dos Wheeler como pano de fundo para uma crítica à sociedade estadunidense dos anos 1950, perdida nas entrelinhas do american way of life, o filme nada mais consegue do que ser sério, e só. “Foi Apenas um Sonho” revela-se então um sub-“Beleza Americana”, mas com a terrível e inadmissível agravante de apresentar críticas bem menos consistentes e veementes do que a obra de 1999. Pior ainda é constatar que o humor cínico da obra estrelada por Kevin Spacey é substituído aqui por um drama que utiliza recursos deveras artificiais para tentar decolar.

Quais recursos seriam estes? Vários. A começar pelo drama de April. A moça era uma aspirante à atriz, correto? Sim, até aí tudo bem. Mas então porque cargas d’água ela manifesta a vontade de abandonar tudo, mudar-se para Paris e exercer uma profissão completamente diferente da de atriz? E qual seria o propósito das traições de Frank? Fazer com que o mesmo perceba o quão infeliz ele é em sua união conjugal? Criar sentimentos de culpa ao mesmo? Fazer com que April demonstre certo desdém ao descobrir a verdade? Enfim, temo que, caso a hipótese real seja alguma dentre estas três, Justin Haythe tenha falhado terrivelmente em todas as alternativas.

Resumidamente, a, aparentemente, estranha esnobada que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas deu em “Foi Apenas um Sonho” justifica-se a partir do momento em que terminamos de assistir ao mesmo. Almejando estabelecer criticas ao american way of life, o filme nada mais faz do que chover no molhado e causar inúmeras decepções em seu público alvo, principalmente aos espectadores que vão ao cinema esperando ver um roteiro bem alicerçado, contando com inúmeras situações que exponham as falhas gritantemente visíveis na sociedade estadunidense (e não só na sociedade estadunidense como em qualquer outra sociedade que adote o capitalismo como sistema econômico). Não bastasse isso, Sam Mendes ainda realiza uma direção fraca, nada imaginativa e pouco sensível, ficando bem aquém de seu trabalho em “Beleza Americana”, filme exacerbadamente parecido com este em questão (onde está aquele Mendes excepcional que nos emocionava com um simples saco plástico flutuando pelo cenário?) e os personagens jamais chegam a ser explorados de um modo verdadeiramente satisfatório. “Foi Apenas um Sonho”, no entanto, conta com um pouco mais de qualidades do que de defeitos. O elenco está bem afiado e todos os atores rendem ótimas atuações (apesar de que nenhum deles mereciam, sequer, ser indicados ao Oscar) e a reconstrução dos anos 1950 (realizada através da perfeita união entre trilha-sonora, direção de arte e figurinos) é formidável, sem contar, é claro, na fotografia que acaba conferindo à trama a sensibilidade que a direção e o roteiro não conseguiram conferir.

Que sirva de lição para que o próximo cineasta que se propor a criticar o sistema, a sociedade, ou qualquer outra coisa que seja, que o faça com consistência, com embasamentos, com argumentos e, principalmente, com amor ao que está fazendo, não aos lucros que poderá obter fazendo o mesmo.

Avaliação Final: 5,3 na escala de 10,0.